Em meados de 1693 desembarcava em uma cidade portuária brasileira, após meses alternando portos e mar constantemente, uma jovem e bela austríaca chamada Laura. Era amante, ainda que não soubesse disso, de um excêntrico marinheiro filho de pai holandês e mãe javanesa que parecia gostar mais do seu cachimbo do que da própria moça que chamava atenção por onde quer que passasse com sua pele de marfim, olhos de mercúrio e os longos cachos cor de fogo, com seios volumosos e traços delicados que ainda que vestidos por trajes simples passava um ar de elegância acentuados lado a brutalidade das linhas de seu acompanhante distraído a beira-mar.
Não tinha amigos, não falava português, só alemão e um inglês não muito bom, vivia numa pensão com o dinheiro que o amante lhe entregava a cada retorno, um quarto pequeno, uma cama barata entre paredes brancas com uma mesinha perto da janela diariamente ocupada esperando o retorno de seu marinheiro respirando o ar salgado ora só do mar, ora de lágrima instantaneamente evaporada pelo forte e constante vento do cais.
Um dia o dinheiro acabou sem que ele retornasse, ninguém nunca lhe disse o que aconteceu, soube depois de alguém que morrera em Batam em 1695 de varíola, essa morte foi o que me permitiu conhece-la e também experimentar da maior desgraça da minha vida até então, muito do que relatei até aqui só consegui reunir pelo desejo de contar essa história, tudo que direi agora foi o que vivi.
O ano era 1696, após anos estudando na Europa a mando de meu pai, que sem filhos homens, depositou em mim todos os esforços para continuar seus negócios com contraindicação de diversos amigos e recusas de diversas escolas, havia retornado para cidade que nasci. Pouco interessa o que estudei ou quem são meus pais, acredite que me arrisquei mais no transcorrer do texto, não quero expor minha identidade.
Nas minhas andanças de fim de tarde, no meio daquele fluxo intenso do piso irregular do cais onde seres da noite e do dia se misturavam e viravam uma massa de medo, julgamento e desejo em conflito, vi Laura pela primeira vez, retraída, só os olhos em movimento, tentando identificar talvez no meio dessa Babel do novo mundo e competindo com outras prostitutas nativas alguém que poderia e gostaria de ouvi-la, de tê-la.
Gostar certamente não seria problema, seu destaque era ainda maior sob esse tipo de luz, um magnetismo que crescia, o mercúrio dos olhos ainda mais flamejantes, os cabelos vermelhos, labaredas violentas. Fui fisgada, retornei para casa ciente de que seria impossível resistir a um novo mergulho na madrugada vazia do porto em busca dela.
Retirei-me mais cedo após o jantar, contei estar demasiadamente cansada por mais uma noite insone, esperei ansiosamente o silêncio invadir a casa, prendi os cabelos em coque, no fundo falso de minha mala peguei as calças, o tecido com o qual já havia me habituado a enfaixar e esconder meus seios que não eram grandes, mas notáveis, pus uma camisa, olhei a janela, aguardei esse silêncio se expandir por toda rua, desci, vesti a capa de meu pai, pus sua cartola, minhas botas. Saí pelos fundos, o ar salgado e gelado me invadindo, volta e meia olhando para trás, a sensação de ser seguida, e talvez fosse mesmo, seguida pela sensação de sujeira pelo que estava perto de cometer, ainda que não fosse a primeira vez.
A tentativa falha de um andar imperceptível, tudo tinha ruído, eu ia e vinha onde a observei mais cedo, outras apareciam, se ofereciam, não queria, queria ela, somente ela. “Não, querida, não procuro isso apenas estou a passeio.”, “Sim, problemas para dormir”, “Não, posso conseguir sozinho”. Enquanto a procurava, me perguntava ansiosa se relutaria, mesmo com pagamento fui negada em outras ocasiões, corri riscos de escândalos, se negasse ofereceria o dobro, o triplo, precisava estar com ela, quatro vezes mais para garantir seu silêncio, não sabia eu ainda que a vida dela por aqui era quase como se fosse muda entre holandeses, africanos e nativos.
Resolvi me enfiar em ruelas em busca dela, seria melhor se a encontrasse longe das outras, mas a probabilidade seria mínima, suspeitava, porém, onde ficavam os locais mais adequados para uma prostituta de rua, um limbo entre onde moravam os miseráveis e onde vivia a elite que eu imaginava, por seus adornos e roupas, ser sua principal clientela. Tive sorte, encontrei-a, a pele brilhando a lua cheia de um céu limpo, a primeira hora da manhã se aproximava do fim.
Tentei português, fez que não entendia, tentei inglês era o que eu mais sabia, “Quanto custa?”, disse-me, havia uma melancolia na sua voz, dei o dinheiro, pediu para acompanha-la, percebi que ela tinha dificuldade em formular as frases, e um sotaque forte que não sabia dizer ao certo de onde era. “De onde você veio?”, ela demorou um instante, não sei se tentando formar a frase na cabeça, ou pensando se valia a pena mentir, “Heiliges Römisches Reich”, eu não falava tão bem alemão, mas o suficiente para esse curto espaço de tempo que estaríamos juntas e para o que faríamos, respondi em alemão que conseguia falar com ela assim.
Chegamos a um casebre, ela abriu a porta, perguntou se preferia que tudo fosse feito às escuras, disse que queria vê-la, acendeu algumas velas. Havia apenas a cama, uma mesinha na janela com uma única cadeira, um armário, uma mala no chão, uma porta que dava no que parecia e logo se revelaria ser um banheiro minúsculo. Sentada na cama, sob aquela luz, eu vi que não apenas sua voz tinha esse ar triste, os olhos que a distância pareciam de um desdém que denotava uma certa superioridade, autoridade, que atacavam meu caráter de submissa, frente a frente eram de uma melancolia inebriante de quem parece não ter nada a perder e só espera o fim.
Naquela luz também meu disfarce era enfraquecido, ela me encarava, contudo, parecia indiferente, não parecia com traço de indagação de quem tenta adivinhar o que sou, ela me olhava como se já tivesse entendido o que eu era e não se importasse. Ela sentou na cama, tirei a capa e a cartola revelando meu cabelo preso, soltei-os. Juntei-me a ela na cama. Ela não disse nada, eu também não disse, ela era chama, toda chama, aqueles olhos, aquele cabelo, o colo do seio exposto naquele decote, os lábios tingidos de um vermelho vívido. Beijei-os.
Eu que me mostrei fria naquele primeiro contato também era chama dentro de minha casca de ar sombrio, adornada por meu longo cabelo preto. Ela pôs a mão na minha nunca, como se me convidasse a me afundar, queimar a casca em sua chama e fazer de nós apenas uma. Desabotoou minha camisa, desfez o nó que apertava meus seios com suas auréolas de um marrom pálido que tentava esconder quando saía naquelas noites dentro de mim.
Levantou-se fez o vestido deslizar por seu corpo até o chão, tudo era chama, os mamilos rosados, os seios firmes, os pelos que me coloquei entre de joelhos — que prece! — enquanto apertava seus seios, provava seu sabor, como se fosse a última coisa que eu provaria na vida, ela me estimulava agarrando meus cabelos e pressionando minha cabeça entre suas pernas, até que puxou-os, afastou-me, me guiou por eles de volta a cama, pôs-me sentada, arrancou minhas botas, minhas calças, minha calcinha e repetiu meu ato, volta meia encarando minha face ofegante com aquele olhar que a tristeza dava indícios que jamais abandonaria.
Deitamos na cama invertidas como eu era, ela entre minhas pernas, eu entre as dela, ela parecia ter feito aquilo por muitas noites, madrugadas, na sua vida, e eu me perguntava onde, se tinham outras tantas invertidas por aqui.
De todas minhas noites e madrugadas secretas na vida, essa que ainda nem tinha sido concluída era sem dúvida alguma a melhor, tentei ir mais além do que fui com a maioria, não conseguia e não queria verbalizar nada, cacei sua mão guiei até o meio da minha bunda, os seus dedos até a entrada do meu cu e pude ser feliz porque ela tinha compreendido. Afastou-os secos, retornaram molhados no intervalo que sua língua deu a minha boceta, colocou primeiro dois, percebeu rapidamente o que eu já tinha feito outras vezes, colocou quatro, abriu-os dentro de mim, repetidamente, retirou-os, abriu meu cu, invadiu-me com a mão inteira até o punho, reprimi com um corte de lábios entre dentes meu urro de dor e satisfação, ia e vinha dentro de mim com a mão e com a língua não resisti por muito tempo gozei na boca, e ofegante consegui que gozasse na minha logo depois.
Todas as despedidas nessas noites só minhas, considerava só minhas pois para elas, eu era só mais alguns trocados, eram esquisitas, envolviam um silêncio profundo enquanto me lavava e depois me vestia. Ela me ajudou com a faixa nos seios, eu a agradeci, retornei ao vento da noite, mas com vontade de ficar para sempre ali.
Cheguei em casa perto das três, consegui a contratar outras vezes por alguns meses, até que meu pai resolveu me levar para uma viagem de negócios na Europa, quando retornei a procurei, mas não a encontrei em lugar algum, nem em sua casa, não me atrevi a perguntar a alguém. Mas você deve estar se perguntando porque encontrou essa história em um periódico de horror e onde está a desgraça da minha vida burguesa. Se chegou até aqui, saiba que essa é apenas, eu diria, metade da história.
Tudo começou quando sonhei com Laura, irei chamar por agora de sonho, pois naquele dia e em alguns outros que se seguiram a ele, eu acreditei que eram apenas sonhos. Já havia sonhado com Laura outras vezes, esses, sonhos de fato, todos se davam naquela casa que ela me consumiu a primeira vez e outras tantas, eu acordava com uma satisfação tranquila.
Esse sonho diferencial se deu no meu quarto na casa do meus pais, acordava no meio da noite com um peso sobre mim, o susto da sensação se desfazia quando o luar que entrava pela minha janela aberta permitia reconhecer quem — não usarei o que ainda —, estava sobre mim, eram as linhas tão distintas que saboreei meses atrás, sua pele fria como o vento, onde estava a chama? Os gestos com algum enrijecimento afastando meus lençóis, eu dormia nua, sua língua gelada e seca me invadiu com as unhas cravadas nas minhas cochas, logo sua pele voltava a ser chama como eu era, sua língua era fogo e molhada como minha buceta, gozei e tornei adormecer no que acreditava ser o sonho.
Acordei exausta. Quando levantei da cama, tive que me segurar na cabeceira para não cair com uma tontura e um escurecimento de vista repentinos, fechei os olhos, respirei fundo e me recompus. Era o enterro de um dos melhores amigos do meu pai, cogitei ficar na cama e não ir, mas tinha que comparecer. Coloquei meu único vestido longo preto, um chapéu com véu cobrindo os olhos. A cidade era estardalhaço e certo medo, a causa da morte era um mistério para todos, tinha ouvido sobre um ou outro caso similar, o primeiro de grande repercussão foi de um senhor de engenho.
Meu pai contara que tudo começou quando ele se queixou de falta de energia, era um viúvo português com dois filhos, tinha bigodes espessos, era bem gorducho e envolvido com a exploração de ouro. Com o passar dos dias a falta se intensificou e mal podia sair da cama ou da poltrona por muito tempo, um médico foi acionado, declarou com pesar que não sabia dizer o que lhe consumia, mas que recordava do caso do senhor de engenho com grande preocupação. O coração batia mais lentamente a cada novo dia de visita, a pele era cada vez mais fria, mais pálida, o corpo cada vez mais magro, extenuado.
No amanhecer de dois dias atrás, o filho encontrou-lhe rígido na cama, se fora o ar e o restante da força do coração, e ouvira-se um boato de que o legista constatou uma quantidade irrisória de sangue, boato que meu pai contava com um riso em zombaria cessado por um lânguido suspiro. Rira com ele, como ri outras vezes que ouvi ou li durante minha estadia no outro lado do oceano em alguns periódicos sem crédito histórias similares. Era uma cria cultivada desde berço pela ciência e pela filosofia e me arrependeria — como me arrependeria! — amargamente de todo meu riso, do meu escárnio, prepotência de todos esses anos.
Todos os dias ela me visitava e o cansaço aumentava e se misturava ao desespero. Ainda podia caminhar, mas o descompasso dos meus pulmões era nítido, não precisava de muito para ficar ofegante, minhas mãos estavam mais frias, pensei no amigo do meu pai, no senhor de engenho, pensei nas histórias que tratei como baboseiras de gente sem neurônios, procurei por uma agulha entre as coisas da minha mãe, ria de mim mesma, um riso sem força, incrédula no que faria, furei meu dedo com a agulha. O sangue que fluíra livremente em outras lesões que tive na vida, agora parecia fazer um grande esforço para me deixar, meus dedos ficaram trêmulos, seguidos por minhas mãos tomadas pelo medo.
Precisava encontrar Laura, ou saber o que tinha lhe acontecido. No fim da tarde, naquele momento igual ao que a conheci fui ao cais do porto, não esperava vê-la e não a vi de fato, fui conversar com outras damas da noite, perguntar sobre seu paradeiro, com uma ladainha de que éramos grandes amigas, que eu passei muito tempo longe e quando retornei não a encontrei novamente e gostaria, me olhavam com desconfiança, desconversavam.
O sol estava prestes a partir de vez quando uma mulher de meia idade, uns quarenta anos, talvez, chamada Leonor, se aproximou de mim, desculpou-se e disse ter ouvido o que eu conversei com outras moças. Era uma holandesa, loira, disse que conhecia Laura desde que chegara com o amante no Brasil, mas nunca conversou, só a observava, e deu-me a assombrosa notícia, ela havia morrido há alguns meses.
Não tinha muitos detalhes de como, já tinha visto ela cuspir sangue algumas vezes, apenas suspeita que fosse disso, disse que lamentava muito que eu tivesse perdido uma amiga tão querida como eu demonstrava ser, mas a lágrima que saía de mim, não era só por Laura ter partido, era do medo, medo de me ver frente a frente com um inacreditável que não saberia como sair. Disse-me que foi ao enterro, houvera um, um de seus clientes que parecia a querer muito bem pagou tudo, que podia me levar até o túmulo para me despedir dignamente, agradeci e disse que a procuraria em outro momento. Fui para casa com a certeza de que não sobreviveria a muitos desses encontros.
Jantei, comuniquei que subiria mais cedo dessa vez, mais uma vez, meus pais perguntaram se havia algo de errado, neguei, não tirei a roupa, me coloquei em pé na janela, esperando o que quer que fosse, estava determinada a não dormir, engano. Resisti bravamente, até que minhas pernas não puderam me sustentar mais, acordei com algo quente a vasculhar minha boca, era a língua dela, pouco a pouco com os sentidos retornando a mim e ciente da realidade e da natureza sinistra do que estava acontecendo a mim, eu era tomada pelo prazer que me provocava e rivalizava com a vontade de viver que tinha, quase cogitei me entregar, deixar com que me levasse de uma vez, saboreando-a até o fim, contudo, meu coração que tentava heroico manter seu ritmo me deu o impulso que eu precisava, pus as mãos nos seus ombros, as mãos que só imploraram até aquele instante para grudá-la mais em mim e arremessei para longe com toda a força que dispunha, ela me contemplava, a tristeza não tinha abandonado seus olhos, a lua me mostrava parte de sua face corada como nunca estivera em vida.
“Suma daqui! Deixe-me, demônio! Deixe-me! Deixe-me!” eu berrava repetidamente como uma oração desesperada e ela se aproximava mais de mim, até que pude ouvir passos pela casa e apaguei não antes de conseguir vislumbrar o espectro abandonando o cômodo convertido em forma borrada que se unia ao vento da madrugada.
Quando acordei, estava na minha cama, minha mãe sentada numa cadeira ao meu lado, e meu pai em pé ao lado dela. Pensei em tudo que vinha me acontecendo, pensei no que tinha ouvido e lido quando estava longe dali e lembrei da única vez que li uma solução para a tormenta que estava passando, não tinha outra saída, era preciso convencer meu pai a me ajudar a executá-la.
Minha mãe era muito cristã jamais permitiria, disse que queria conversar a sós com ele, diante dos meus olhos suplicantes e cansados ela cedeu e se retirou, precisava lhe dizer meias verdades.
Muito do que disse era parecido com o que havia às moças do cais e principalmente a Leonor, que Laura e eu éramos muito amigas desde que retornei ao Brasil a primeira vez, e que na segunda não a encontrei mais e soube que havia morrido. Revelei também que ela era prostituta e por isso, jamais falei dela para ele, porque sabia que seria uma amizade que desaprovaria e acrescentei que só soube do fato quando já éramos íntimas e não podia simplesmente ir embora da vida dela, era uma mulher muito sozinha.
Ele me perguntou porque falava tanto dessa Laura, porque ela era tão importante para ser mencionada agora. Falei sobre as aparições sem tantos detalhes e de como me sentia enfraquecida, do teste que fiz, e lembrei do boato sobre seu amigo, ele ensaiou argumentar que eu estava delirando, mas o chamei a razão. Falei que meus sintomas eram muito parecidos aos dele, que olhasse melhor para mim, questionei se não me achava pálida demais, que tocasse minhas mãos e perguntei se não as achava frias demais, apelei e disse que não tinha mais tempo, que precisava resolver aquilo, que ainda que me protegessem, que me vigiassem, em algum momento o encontro fatal aconteceria.
Também me interrogou sobre como eu achava que poderia me livrar e contei tudo que li no artigo do Mercure Galant, “Cadáveres Nadam No Caixão”, quando estava na França. Protestou e disse que era, além de imoral, impossível, eu disse que era possível com dinheiro e que se ao abrirmos o caixão não encontrássemos o que eu esperava ver, voltaríamos para casa sem seguir adiante em nada mais grave do que já havíamos feito. Ele aceitou ainda que com relutância.
Partimos de carruagem para o cais ao se aproximar a noite, procurei Leonor, disse que queria ir ao cemitério, e pedi que me guiasse ao túmulo, ela perguntou se não poderia ser de manhã pois perderia alguns clientes e estranhou o horário da visita, argumentei que cobriria o valor de cada cliente que achava que perderia, era o suficiente para que ela engolisse suas outras perguntas.
Meu pai guiava e íamos dentro, paramos distantes do cemitério para irmos caminhando e levantar menos suspeita. Chamamos pelo vigia, que confuso demorou mais apareceu, claramente estava dormindo. Meu pai conversou com ele, pareceu transtornado, deu-lhe algum dinheiro, o transtornou sumiu de sua face, com tanta miséria e um pouco de declinação moral as pessoas se vendem facilmente.
Era uma cova simples, eu estava com Leonor, o vigia e meu pai mais a frente, o vigia com uma pá. Leonor perguntou em um sussurro desesperado: “Você não era amiga dela? O que vocês tão fazendo?”. “Algo terrível, mas que você entenderá, se ficar aqui conosco, que uma amiga precisava fazer.” Retirada a terra, de braços dados com Leonor me aproximei do caixão a mostra, o vigia o abriu e não pude conter meu grito junto a minha acompanhante que desmaiou, meu pai conversava com o vigia negociando os termos para se manter em silêncio toda a vida.
Laura estaria como em vida se não fosse a pele que vi na outra madrugada tão enrubescida como nunca fora. Sangue saia por sua boca, seu nariz, o corpo que parecia ter a maciez que juntei a mim boiava naquela piscina macabra, adornado por um belo vestido e pelas joias dadas pelos seus clientes.
A partir daí o que meu pai dizia ser imoral e impossível foi feito com facilidade estimulada pela ira sem que eu visse, cuidava de Leonor no chão. Era cedo, tínhamos até a meia-noite. Com a faca que pedi que trouxesse desferiu diversos golpes até a cabeça se desprendeu do restante do corpo, rasgou o vestido na altura do peito e o abriu a procura do coração, pediu ao vigia que segurasse a garrafa, arrancou-o com as próprias mãos, abriu-o com a faca e derramou todo sangue que pôde dentro da garrafa.
O caixão foi fechado com a faca utilizada e o que sobrou daquele coração finalmente gélido que me aqueceu tanto para depois tentar parar o meu próprio. Retornamos ao cais com uma Leonor atordoada, que eu tentava convencer de que tudo que viu foi de fato real e que não havia outra alternativa, detalhei o que foi feito quando ela desmaiou, tentei pagar tudo que havia prometido, ela disse que só queria ir para casa e esquecer de tudo aquilo, que jamais contaria para ninguém e esperava que sua mente parasse de lhe contar em algum momento o que tinha vivido. Confiei no seu desespero.
Chegamos em casa na hora do jantar, jantamos, pedimos para que minha mãe subisse, ela morreu sem saber o que aconteceu comigo. Coloquei luvas, era preciso suportar, não desmaiar, peguei o trigo na dispensa, o sangue com o meu pai, que perguntou se ele não podia fazer isso, eu disse que tinha que ser eu. Uni o sangue a farinha para sová-la seguindo o manual tenebroso, levei ao forno e me forcei a comer aquele pão-de-morte que salvou minha vida. Jamais voltei a ver Laura, nem mesmo em sonhos.
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