Para trás ou para o lado? Nunca foi tão difícil escolher para onde pentear meu cabelo. Qualquer coisa ficava legal com terno. Tentei imaginar como o Lucas pentearia o seu… provavelmente ele usaria sua franja tradicional, se o seu cabelo estivesse grande o suficiente. Talvez o melhor mesmo fosse ir com meu penteado normal. Então penteei meus cabelos para o lado e botei meus óculos, para me enxergar melhor no espelho do banheiro.
Bem… o que esperar desse baile? Os últimos dias tinham sido tão voláteis que tentar prever o futuro era a coisa mais burra a se fazer. Bom… você deve estar se perguntando o que aconteceu depois do… seja lá o que foi aquilo… que aconteceu no meu quarto… aquele dia… com nós três…
Nós três não chegamos a discutir aquilo… tudo ficou meio… estranho… tentamos agir normalmente um com o outro, mas obviamente não estávamos conseguindo. Não era como se nós três ficássemos lembrando o tempo todo… mas tínhamos consciência do ocorrido a todo momento. Sabíamos o que tinha acontecido. Nós três participamos. Eu, pelo menos, me lembrava disso toda hora que olhava para o Lucas e para o Rafa. Era impossível deixar pra lá, embora era exatamente isso que estávamos fazendo. Fazer o que…
Com o passar dos dias, foi ficando menos difícil… mas nem por isso foi ficando mais fácil… continuava… estranho…
Bem… depois de tudo isso, a prova de biologia do Lucas aconteceu, as olímpiadas internas aconteceram, a formatura do nono ano aconteceu, e agora estava para acontecer o tradicional baile dos formandos. Todos os meus amigos iam. Eu, particularmente, não era o maior fã de festas do mundo, mas… tanto Giovanna, quanto Lucas, estariam lá… e eu queria passar mais um tempo com eles, visto que estávamos prestes a entrar num extenso período de férias.
Minha mãe me levou até a festa e combinou comigo que me pegaria mais tarde. Seguimos o fluxo de carros e fomos parar na entrada do salão, aonde estava acontecendo a festa. Desci do carro, despedi-me dela e avancei sobre o arco de flores que decorava a entrada do baile. Conforme ia me adentrando na festa, fui cumprimentando todos os conhecidos que via. Quando cheguei no meio da pista, dei uma olhada em volta até avistar o Lucas, que estava se aproximando de mim.
― Oi, galã de novela! ― Ele me cumprimentou sorrindo.
Sinceramente, o Lucas sabia como me deixar sem jeito… galã de novela? Da onde ele tirava essas coisas? Senti meu rosto esquentar quando o vi.
― Ah… é você, Olhos Verdes… ― eu disse e estendi a mão.
― Oie… ― ele respondeu.
Ele estava bem elegante em seu terno, embora este estivesse justo demais para ele. Mas… qualquer coisa caía bem em seu corpo magro. Seu cabelinho estava penteado para frente e se fechava num topetinho organizado e bem arrumado. Daí ele ficou me olhando estranho.
― Que foi? ― Perguntei.
― Nada… tá gatinho, hein? ― Ele disse rindo.
Não sabia se ele estava me zoando ou se estava falando sério. Talvez meu cabelo estivesse ridículo demais, sei lá…
― Aff… tá parecendo o cabeça de melão… e, por falar nisso, cadê ele? ― Perguntei.
― Não chegou ainda… ― ele respondeu olhando para os lados.
― Hum… quer dar uma volta por aí? ― Convidei-o.
― Claro… pode ser… ― ele aceitou.
― ―
659
Demos uma voltinha pela festa. Tudo estava muito bonito e chique. Tentei estimar quanto essa festa podia ter custado. Fui andando junto com Lucas pelo salão enquanto eu tentava inutilmente achar a Gi.
― Ela ainda não chegou. ― Ele disse.
Aff… como ele poderia saber que eu estava procurando ela?
― Ela quem? ― Me fiz de bobo.
Ele olhou sério para mim.
― Tá… ― admiti. ― Pareço um idiota, né!?
― Um idiota bem fofo! ― Ele respondeu.
Aff… ele insistia nesses elogios sem pé nem cabeça… eu não sabia se ficava feliz ou triste por recebê-los. Por um lado, eu me sentia lisonjeado. Mas, por outro, eu sabia que ele dizia isso só para tentar me deixar feliz… seu amor era o Rafa, de qualquer jeito…
Fomos andando pela festa até chegarmos ao bar. Chegando lá, eu pedi:
― Duas batidas, por favor. Guaraná com morango.
Ele preparou os drinks e, enquanto isso, eu aproveitei para dar uma olhadinha no Lucas. Ele usava um terno, uma gravatinha e seu cabelo curto se alinhava num topetinho um tanto quanto atraente. Fora seus olhos verdes, que pareciam brilhar como nunca. Quando olhei para ele, ele me olhou de volta e sorriu. Eu, timidamente, voltei a olhar para frente e tentei entender como o barman preparava essas batidas.
Quando ele terminou, me entregou os copos. Passei um para o Lucas, que disse:
― Uau! Guarda-chuvinhas! Quem é que está pagando por tudo isso?
― Hahaha! Esqueceu que estamos numa festa da Nova Aliança?
― Ah… é verdade… ― ele disse rindo.
Quando ele foi beber, eu disse:
― Espera! Quero propor um brinde! Vem cá!
Nós dois nos afastamos um pouquinho do bar e eu repeti:
― Eu gostaria de propor um brinde!
― Um brinde? A quem?
Pensei por um instante e disse:
― Um brinde! A todas as crianças imundas, desprezíveis, ignorantes, podres de ricas, sem maldade no coração e sem ambição alguma que estudam na Nova Aliança e financiam nossos estudos! Nos dando, além de livros e apostilas, guarda-chuvas inúteis nos nossos copos, sem que tenhamos que pagar um mísero tostão pra isso! ― E eu ergui meu copo.
― Profundo, hein? ― Ele disse sorrindo. ― Tava inspirado?
― Inspirado não… ― eu o corrigi. ― Apaixonado.
Daí nós dois erguemos nossos copos e depois demos um gole nas nossas batidas.
― Isso é bom… ― ele disse.
― Concordo.
― A última vez que eu tomei isso… acabei beijando a pessoa pela qual eu estava apaixonado… ― ele confessou.
― Sério? ― Eu disse surpreso. ― Não me diga… então vamos torcer para que estas não estejam vencidas essa noite, né?
Mas, estranhamente, a primeira pessoa que me veio na cabeça foi… ele mesmo… fiquei imaginando se ele tinha pensado o mesmo de mim…
― Com toda certeza. ― Ele disse e ergueu o copo.
Depois do nosso brinde, saímos andando pelo salão mais uma vez. Daí, do nada, Lucas deixou seu copo cair. Quando olhei para ele, percebi que ele estava estranho… parecia que ele
― ―
660
estava em choque… ele tinha parado no tempo, tanto é que sua mão continuou erguida como se ele ainda estivesse segurando o copo.
― Lucas? Lucas! ― Eu o chamei, mas ele não respondeu. ― LUCAS! ― Gritei.
― QUE FOI? ― Ele gritou comigo. ― Que foi? ― Ele disse novamente.
― Ei! O que foi? Você está bem? ― Perguntei.
― Sim. Por que? ― Ele soou incisivo.
― Você ficou estranho do nada… ― tentei explicar.
Quando eu percebi que ele não estava entendendo, eu disse:
― E deixou seu copo cair…
Ele olhou para baixo e percebeu o que tinha acontecido.
― Ah… desculpa, Arthur. Me distraí um pouco.
E ele voltou a olhar na direção que olhara anteriormente. Olhei naquela direção e reconheci imediatamente o que provavelmente o tinha feito ter um ataque de pânico.
― Ah… é aquele Caio… não é?
Caio era um dos amigos de Hermes. Eu não sabia se ele tinha participado do bullying que Lucas sofrera naquele outro dia. Provavelmente sim. Essa era uma das coisas que Lucas odiava falar sobre. Ele sempre fugia do assunto e nunca chegou a contar de verdade o que acontecera com ele. Eu, sem muita certeza, sempre imaginava o pior… na minha cabeça, Hermes devia ter feito o Lucas chupá-lo… ou devia ter feito coisas piores… Rafa também estava lá, então… vai saber que tipo de trauma aquele imbecil tinha proporcionado aos pobres amantes.
Foi quando Lucas ergueu a mão e mostrou o dedo do meio para ele. Imediatamente, segurei ele pelo pulso e abaixei seu braço com força. Que porra ele estava fazendo?
― Tá maluco, Olhos Verdes!? ― Gritei. ― Quer arrumar mais problemas pra gente? Olha o tamanho desses caras!
Mas ele continuou encarando-os com cara de bravo.
― Lu! ― Chamei-o pelo seu apelido carinhoso.
Na mesma hora, ele olhou imediatamente para mim.
― Ei! ― Tentei trazê-lo de volta. ― Não vale a pena… para!
― Vamos sair daqui! ― Ele disse virando as costas e indo embora.
Ele saiu quase correndo.
― Ei! Peraí! ― Chamei-o. ― Peraí!
Daí nós dois voltamos para a entrada do salão. Lá, ele tentou se desculpar comigo.
― Foi mal, Arthur… é que…
― Ei… relaxa… ― tentei acalmá-lo. ― Não deixa ele estragar sua noite. Tenta… tenta não pensar muito naquilo…
― Tá… ― ele disse enquanto respirava fundo para se acalmar.
― Ele… ele meio que repetiu de ano… ― soltei sem querer.
― O que!? ― Ele exclamou.
― Ei! Não era para você estar surpreso com isso! Eu te avisei que ele estava quase para repetir!
― Eu sei… eu sei… é só que… eu acho que ainda não superei… ― ele confessou.
― Olha só… ― tentei acalmá-lo novamente. ― não tem problema! Mas você tem que admitir que ele nunca mais se meteu no seu caminho… ― eu disse sabendo da ameaça que Gabriel tinha lançado contra eles.
― Ainda! ― Ele disse nervoso.
― Ei! Calado! Ele nunca mais se meteu no seu caminho… pronto. Agora você só tem que ficar longe do dele! ― Expliquei.
― Tá… eu sei… eu acho… ― ele concordou.
― ―
661
Daí ficamos conversando lá um pouquinho até o Rafa chegar.
― Oi, Arthur… ― ele disse e me cumprimentou.
― E aí… ― eu disse.
Daí ele se virou pra o Lucas, estendeu a mão e disse:
― Oi!
― Oi! ― Lucas respondeu.
Quando Lucas apertou sua mão, ele o puxou para si e o beijou. Quando ele fez isso, virei a cara para o outro lado, por reflexo. Me deu uma pontadinha de inveja por ele estar beijando o Lucas. Tentei imaginar como seria bom ter essa liberdade para beijar alguém. Imagine só… poder puxar seu amor pelo braço e tascar-lhe um beijo quando bem quiser.
― Ah, deus do céu… arrumem um quarto para vocês… ― Eu disse sem saber o que dizer.
Mas eles me ignoraram. Continuaram se beijando por mais uns trinta segundos, até Rafa se desgrudar de Lucas e soltar um:
― Você tá lindo!
― Ai, para, Gatinho… ― Lucas disse timidamente. ― O Arthur tá vendo…
― Eu não me importo… ― Rafa retrucou. ― Depois do que ele já viu… ei… senti saudades, meu amor…
― Mas nos vemos ontem! ― Lucas disse.
Credo… que melodrama que esses dois estavam fazendo… chegava a ser irritante.
― Eu sei… eu sei… mas senti saudades mesmo assim…
― Ah… eu também…
E eles se beijaram mais uma vez.
― O que vocês estão fazendo aqui fora? ― Rafael perguntou.
― Esperando por você, meu Gatinho… ― Lucas disse todo manhoso.
Nem parece que há alguns minutos atrás ele estava tendo um ataque de nervos… esse garoto só podia ser bipolar…
― Awnt! Obrigado, meu amor! ― Rafa agradeceu e lhe deu mais um beijinho.
― Ah, pelo amor de deus… ― eu disse. ― Não me façam ir no banheiro vomitar.
― Xi… ― Rafa disse e olhou para mim. ― Alguém tá com ciúmes…
Nossa… isso me deixou irritado.
― Nossa, vou explodir de ciúmes aqui… ― disse cruzando os braços.
― Cadê o resto do pessoal? ― Rafa perguntou.
― Só chegou a gente… ― Lucas respondeu. ― E o Miguel… que está lá dentro.
― Hum… o Igor ainda não chegou? ― Rafa perguntou.
― Não… ― Lucas respondeu.
― Entendi… ― ele disse.
Daí ficamos conversando lá até Lucas dizer:
― Ei! Arthur! Acho que sua garota chegou…
Tentei arrumar meu cabelo para ficar mais apresentável.
― Como estou? ― Perguntei.
― Tá lindo. ― Lucas me elogiou.
― Tá muito gostoso… ― Rafa me zoou.
Daí nós assistimos quatro garotas lindíssimas descerem de um carro aos gritinhos histéricos. Mas eu só tinha olhos para Giovanna. Ela conseguia prender minha atenção mais que ninguém. Ela usava um vestidinho curto e cor-de-rosa e suas pernas estavam de fora. Senti um movimento lá embaixo quando a vi. Daí elas começaram a tirar fotos em frente à festa.
― Nossa… é verdade… ― Lucas começou dizendo. ― A Gi tinha me dito que ela e as amigas fariam um esquenta antes de virem pra cá… na casa da Bruna.
― ―
662
― Esquenta? ― Perguntei sem ter a menor ideia do que isso significava.
― É… elas iriam se arrumar para a festa… ― ele explicou.
― Hum… entendi…
― E eu acho que, depois do baile, elas ainda vão fazer uma festinha do pijama na casa da Bruna… ― Lucas acrescentou.
― Festinha do pijama? ― Perguntei.
― É sim… ― ele confirmou.
― Hum… eu sei bem o que rola nessas festinhas de pijamas… ― Rafa disse tentando se exibir.
― Como assim? ― Perguntei.
― As garotas se reúnem para falar sobre os garotos que beijaram na festa!
Nessa hora, fiquei nervoso. Eu não sabia o que iria acontecer esta noite, mas, se eu beijasse ela, será que ela falaria bem de mim? Será que ela gostaria de me beijar?
― Sério? ― Perguntei preocupado.
― Aham. Depois, elas dão nota para cada um deles… ― senti que Rafa tentava me amedrontar. Estava funcionando. ― E, se o garoto beijar mal, fica com o filme queimado por toda eternidade… ainda bem que a gente treinou antes, né, Arthur?
Quando ele disse isso, olhei para eles e senti minha face ficar vermelha. Me lembrei do beijo que o Lucas tinha me dado e, inevitavelmente, acabei secando sua boca, que agora ele apertava levemente com os dentes superiores. Pisquei duas vezes e voltei a olhar para as garotas.
― E depois, elas ainda conversam sobre os garotos que foram ainda mais corajosos e que tiveram coragem de pedir um boquete para elas.
Me imaginei pedindo um boquete para a Giovanna. Altos pensamentos surgiram na minha cabeça. Eu estava ficando cada vez mais nervoso. Eu não teria coragem de fazer isso. Eu não era corajoso o suficiente.
― E, no final da noite… só no final da noite mesmo… elas conversam sobre os meninos ainda mais valentes que tiveram coragem de se aventurar no vale proibido do prazer! Mais conhecido como buceta!
Lucas começou a rir e disse:
― Desse jeito vai acabar assustando o Arthur, Rafa.
― Ei! ― Reclamei.
― Que assustar o Arthur o que! ― Rafa disse. ― Ele já está pronto! A gente fez questão de garantir isso, se lembra? ― Ele disse zoando.
Fiquei feliz por ele ter dito que eu estava pronto… mas isso não me impediu de ficar vermelho novamente.
― Mas… aí… ― Lucas disse. ― Se tudo isso que você está dizendo for verdade, Rafa…
― Sim… o que tem?
― A gente podia fazer uma festinha do pijama também… ― ele sugeriu.
― Super apoio… ― Rafa concordou. ― Topa, Arthur?
Nessa hora, eu fiquei mais vermelho ainda e disse:
― Sai fora! Eu, hein! Festinha do pijama é meu pau.
― Ai, seu grosso! ― Rafa disse me zoando. ― Mas, agora, falando sério, Arthur… sabe o que eu e o Lucas estávamos discutindo?
― O que? ― Perguntei.
― Como seria um beijo triplo? Você já deu um?
Não sei como fui burro de levá-lo a sério por um instante. Quando ele disse isso, desviei o meu olhar.
― ―
663
― Ou então… a gente podia brincar de sanduiche! ― Ele sugeriu.
― E como se brinca disso? ― Perguntei. Quando me toquei, disse: ― Puta que pariu, Rafael! Dá um tempo! ― E botei a mão na cara.
Foi quando o grupinho de garotas veio em nossa direção. Quando a Giovanna viu Lucas, foi correndo lhe dar um abraço.
― Luluzinho! ― Ela gritou.
― Oi, Gi! ― Ele a cumprimentou.
― Luluzinho? ― Rafa exclamou. ― Gostei…
― Ain! Oi, Rafael! Meu amor! ― Ela disse e foi dar um beijinho nele.
Aí ela finalmente se virou para mim e disse:
― Oiii! Anderson! Tudo bem com você?
Quando ela me chamou de Anderson, meu chão sumiu. Ela não sabia meu nome? Sério!? Essa garota não sabia a porra do meu nome!? Me senti triste e desorientado. Como eu poderia ficar com ela essa noite se ela nem sabia meu nome!?
― Ah… tudo… ― eu respondi sem graça.
Ela me deu um beijo na bochecha, que me fez ficar vermelho novamente.
― E aí! Luluzinho! ― Ela disse para o Lucas. ― O que me conta? Novidades?
― Hum… até agora não, né… ― ele respondeu. ― Mas a festa só está começando… as fofocas estão por vir!
― Ah… pode ter certeza! ― Ela concordou. ― Ei! Eu vou ali com as minhas amigas cumprimentar o resto do pessoal, depois a gente conversa!
― Tá, minha gata! Vai lá! ― Lucas disse.
Senti um pouquinho de inveja do jeito que o Lucas a chamou. Minha gata. Quem me dera poder chamá-la assim…
― Acho que temos muito trabalho pela frente, Rafa… ― Lucas me zoou.
― Pode apostar que temos… ― ele concordou. ― Não é mesmo, Anderson?
Quando ele disse isso, me deu vontade de chorar. Depois disso, demos mais uma volta pela festa e acabamos nos encontrando com Igor, que nos convidou para se juntar a ele na sua mesa. Na mesa se sentou o Rafa com o Lucas, o Igor com a Sarah, o Miguel com sua “amiga” e eu comigo mesmo. Ficamos conversando, ou melhor, eles ficaram conversando lá por um tempo até começar a tocar a música Sorry do Justin Bieber. Sarah e Rafa se animaram para dançar e acabaram puxando todos para pista. Eu não queria ir, mas… o Lucas insistiu tanto que não eu tive como questionar.
Quando estávamos na pista, eu, o Lucas, o Rafael e o Igor formamos uma rodinha de dança, porém o que eu mais queria era ir embora dali e me sentar, mas eles eram chatos demais para me permitirem fazer isso. Daí cruzei os braços enquanto eles dançavam ridiculamente. Lucas tentou dançar também, mas ele era mais ridículo ainda… daí eu comecei a rir.
― Eiii! ― Ele reclamou.
E, no próximo instante, se aproximou do meu ouvido e gritou:
― VAI TOMAR NO SEU CÚ! EU NÃO SEI DANÇAR!
Tive um arrepio quando senti seu hálito tocar minha orelha e meu pescoço. Daí eu ri e respondi gritando por causa da música alta:
― TÔ VENDO! ESTÁ RIDÍCULO!
― MAS PELO MENOS TÔ DANÇANDO! ― Ele respondeu.
Como se isso fosse alguma coisa… antes ele ficasse parado, que pelo menos, assim, passaria menos vergonha. Ficamos “dançando” ali por mais um tempo até a Giovanna aparecer. Merda… era só o que me faltava…
― ―
664
Por mais que eu gostasse dessa garota, eu, sinceramente, odiava passar tempo perto dela. Sempre quando ela estava por perto, eu ficava perdido. Começava a me comportar de maneira diferente… era como se eu ficasse nervoso… eu me sentia observado o tempo todo… eu não podia fazer coisas ridículas na frente dela, embora era o que eu sempre acabava fazendo. E, por isso, eu acabava sempre medindo cada um de meus movimentos. E isso era estressante. Agora, por exemplo, todo mundo estava dançando… menos eu. O que ela ia pensar de mim? E se ela me achasse um completo chato?
Olhei para o Lucas e o invejei por um instante. Ele não sentia a mesma pressão que eu por estar perto dela. Ele se comportava normalmente. Talvez por não se importar com o que ela pensaria dele. Talvez porque ele não precisasse que ela pensasse nada dele. Talvez porque ele já tinha alguém e não precisava de mais nada…
Foi quando ela começou a dançar com ele de um jeito sensual. Ela virou as costas e começou a rebolar para ele… droga… ela só estava fazendo isso porque sabia que ele era gay e não se aproveitaria dela. Que pensamento merda. Isso não era motivo para se rebaixar desse jeito e dançar assim. Ou talvez ela estivesse fazendo isso só para chamar a atenção dos garotos… vai saber… quem entende as meninas?
Só que uma coisa muito estranha começou a acontecer enquanto eles dançavam. Tentei reprimir esses pensamentos, mas eram inquestionáveis e de natureza instintiva. Minha atenção estava dividida. Eu não sabia pra quem olhava… como eu já havia dito, depois daquela partida de xadrez, na minha casa, eu tinha (ou pelo menos estava) desenvolvendo sentimentos pelo Lucas. Algo nele não estava certo. Algo em mim não estava certo. Por que ele conseguia tanto prender minha atenção? Por que ele conseguia me atrair tanto?
Giovanna conversava com ele, mas não dava para ouvir por causa do barulho. Cada vez que ela se aproximava de seu ouvido, eu ficava mais confuso ainda. Eu não sabia mais quem eu queria ser. Eu não sabia se queria estar no lugar do Lucas, para dançar com ela assim, ou se queria estar no lugar dela, para dançar com o Lucas assim. Foi quando o DJ anunciou:
― Senhoras e senhores, em alguns instantes, daremos início à entrada dos formandos. Pedimos que, por gentileza, os formandos se dirijam até a entrada do salão.
Nessa hora, todo mundo começou a se retirar da pista. Por um lado, me senti bastante aliviado com isso, mas, por outro, o fato desses meus sentimentos pelo Lucas estarem crescendo cada vez mais, me deixou bastante inquieto. Eu precisava tomar um ar.
Eu até poderia ir para a entrada do salão, mas lá provavelmente estaria lotado de pessoas que também estavam tomando um ar. E, sinceramente, a última coisa que eu queria agora era pessoas. Eu precisava de um tempo sozinho, para pensar, daí resolvi sair pelos fundos.
Foi quando, de longe, avistei o Lucas. Até aí nada de novo, mas… imaginem minha surpresa quando percebi que quem estava ao seu lado era um menino e não era o Rafael. Lucas deu uma olhadinha para trás, como se estivesse checando para ver se nenhum conhecido estava os vendo. Será que? Não… não pode ser… eu tinha de segui-los!
Os dois garotos saíram pelos fundos com a maior discrição do mundo. Lucas, principalmente, não parava de olhar para trás para ter certeza de que ninguém os estava seguindo. Reconheci o outro garoto… ele era da minha sala… espera… era o Maurício!
Foi aí que eu liguei os pontos… aquele dia… quando eu estava sozinho com o Lucas e ele se aproveitou de mim para conhecê-lo… talvez… talvez ele não precisasse que o Lucas fosse o seu cupido… talvez ele precisasse que eu fosse seu cupido… e talvez… e só talvez… ele conseguiu… essa não…
Tratei de me esconder quando Lucas olhou para trás. Me escondi numa esquina. Quando tive certeza de que ele não estava mais olhando, continuei seguindo os dois. Mas eles
― ―
665
estavam indo cada vez mais longe. Estavam cada vez mais afastados da festa. O que é que esses dois iam fazer escondidos?
Segui eles até onde deu. Quando eles cruzaram o portão que dava para um campo de futebol, não pude mais segui-los, pois não tinha mais nenhum lugar para me esconder. Meu deus… agora eu estava muito confuso… eu precisava sair daqui…
Saí correndo dali o mais rápido que podia. Será mesmo que o Lucas estava traindo o Rafael com o Maurício? Será que eu devia contar isso para o Rafa? Será que eu devia conversar com o Lucas sobre isso antes? Será que eu devia fingir que não vi nada e não me meter na relação dos dois? E se os dois não estivessem fazendo nada? E estivessem só conversando? Mas por que eles precisariam de tanta discrição e mistério para conversar? Isso não fazia sentido! O mais provável era que os dois estivessem indo ali para ficar… era a única explicação possível! E agora eu sabia disso. E eu odiava saber disso, porque eu não sabia o que fazer com essa informação.
Fugi daquele lugar o mais rápido possível e fui pra o outro lado do clube. Eu precisava pensar. Eu precisava digerir isso tudo. Eu não acredito que o Lucas seria capaz de fazer uma coisa dessas… mas, ainda sim, ele me beijou mesmo estando namorando o Rafa… quando eu acho que estou começando a entender esse garoto… BOOOM! Ele vai lá e me surpreende… acho que nunca vou ser capaz de entendê-lo.
Atrás do salão, onde estava acontecendo a festa, tinha uma trilha de pedras que subia para o alto de um morrinho. A estrada da trilha era formada por blocos de pedras retangulares e brancos. Fui caminhando por ela até chegar num lugar não muito longe, mas bem reservado. O morrinho parecia ser um mirante, onde você conseguia enxergar todo o clube. Cercando o lado mais agudo do morrinho, tinha uma grade de segurança, que servia para evitar que as pessoas caíssem no barranco do outro lado. Nesse lugar não tinha ninguém, só um menino encostado na grade observando a imensidão do clube. Fui até a grade e me encostei lá também.
E agora… o que fazer? Conversar com o Rafa? Conversar com o Lucas? Deixar pra lá? Será que eu devia me declarar para Giovanna? Será que eu devia contar para o Lucas o que eu estava sentindo por ele? Droga… minha vida estava uma droga…
Foi quando eu ouvi um barulho de isqueiro e o menino do meu lado disse:
― Noite difícil?
Tomei um susto quando olhei para o lado e reconheci o menino. Era Caio. O amigo de Hermes. Um dos garotos que tinham bullynado Lucas há um tempo atrás. A princípio, meu coração se acelerou, mas tentei manter a postura e fingir que estava tudo bem. Caio estava com um cigarro na boca e agora usava o isqueiro para acendê-lo.
― Bastante. ― Respondi e voltei a olhar para o clube.
― Garotas? ― Ele perguntou e logo em seguida deu a primeira tragada no cigarro.
― Também, mas não só isso… e você?
Ele demorou para responder. Lentamente, soltou toda a fumaça de seus pulmões e, só depois, disse:
― Elas são todas umas putas mesmo…
Fiquei um pouco chocado com seu linguajar.
― Posso ter um? ― Pedi e apontei para o cigarro.
Ele me olhou com uma cara de reprovação e respondeu:
― Se valorize, garoto.
E, em seguida, deu outra tragada no cigarro e disse:
― Você não quer isso pra sua vida.
Olhei para o céu, suspirei e disse:
― Aff… o que você sabe?
― ―
666
Ele olhou para mim e respondeu:
― Sei que não se consegue garotas com cigarros.
― Quem disse? ― O desafiei.
Algumas garotas achavam garotos fumantes sensuais.
― Aff… e o que você sabe? ― Ele me imitou.
― Sei que deve ser difícil ver todos seus amigos entrando felizes com seus respectivos diplomas na formatura enquanto se é o único repetente da turma. ― Respondi com tom de deboche.
Nessa hora, ele me olhou com uma cara de irritado e disse:
― Isso foi ofensivo.
― Sério? Até que você é bem espertinho pra um repetente. ― Eu o provoquei.
― Aff… e o que foi que eu te fiz? ― Ele disse dando mais uma tragada no cigarro.
Tinha mexido com meu melhor amigo. Será que ele não se tocava? Será que ele não sabia quem eu era?
― Nada. ― Respondi. ― Por que? Não posso ser um cuzão por natureza igual a você?
Nessa hora, ele revirou os olhos e encostou a ponta do cigarro na grade, para apagá-lo.
― Tá… posso ser cuzão, mas pelo menos não tenho um problema com garotas. ― Ele retribuiu a provocação.
― E pelo menos eu não tenho problemas em casa. ― Eu o provoquei de volta.
Nessa hora, o menino partiu pra cima de mim e me segurou pelo colarinho da camisa.
― Como disse? Quem te contou isso? ― Ele gritou e me olhou com raiva.
― Você. ― Eu o provoquei. ― Era apenas um palpite, mas você acabou de confirmar.
― Então você é um espertalhão? Vamos lá, senhor sabichão, me dê um motivo pra não socar sua cara até não sobrar nenhum dente nessa sua boca imunda! ― Ele gritou e me segurou com mais força.
― Não tem. ― Eu respondi. ― Eu acho que é isso mesmo que você devia fazer.
Nessa hora, ele me olhou estranho, respirou fundo e me soltou com um empurrãozinho pra trás.
― Qual o seu problema, garoto? ― Ele disse e se afastou de mim.
Ele respirou fundo mais uma vez e depois colocou a mão no bolso, porém pareceu não encontrar o que procurava. Então ele começou a apalpar todos os bolsos de seu paletó.
― Tá procurando isso aqui? ― Eu disse mostrando o maço de cigarros que eu tinha roubado dele enquanto ele me segurava.
― O que!? Como!? ― Ele disse mais irritado ainda.
Ele veio até mim e tomou o maço da minha mão. Daí ele pegou um cigarro, botou na boca e enfiou a mão no bolso procurando pelo seu isqueiro. Quando ele fez isso, botei um cigarro na boca (que eu tinha roubado antes de ele tomar o maço de mim) e o acendi com seu isqueiro (que eu também tinha pego).
― Aff… fala sério… ― ele disse quando me viu fazendo graça.
Botei os lábios naquele tubinho macio e inspirei a fumaça. Quando a fumaça penetrou nos meus pulmões, senti eles arderem levemente e eu tive uma leve sensação de asfixia, daí comecei a tossir. O garoto veio até mim, arrancou o isqueiro da minha mão e tomou o cigarro da outra. Daí ele jogou o cigarro que eu acendera no chão e pisou em cima.
― Sério… o que tem de errado com você?
Não respondi. Apenas fiquei olhando para ele em silêncio.
― Bastardinho. ― Ele me xingou e virou as costas. ― Dê o fora daqui antes que eu quebre sua cara.
― Pff… você ao menos sabe quem eu sou? ― Perguntei.
― ―
667
― Não. E nem quero saber. ― Ele respondeu.
― Ótimo. ― Eu disse.
Nessa hora, eu fui até ele e o puxei pelo ombro. Ele se virou para mim e eu acertei um soco bem forte na sua cara. O cigarro, que estava na sua boca, caiu no chão e, no instante seguinte, o garoto estava caindo sentado. Senti minha mão arder e meus ossos vibrarem. Nessa hora, meu coração estava a mil. Eu nem sei porquê tinha feito isso. Eu só tinha ficado com raiva dele, pelo que ele tinha feito com o Lucas. E eu não conseguia esquecer. E eu não conseguia perdoar. E agora o garoto estava sentado no chão e me olhava assustado e perdido.
― Sai daqui, cara… ― o menino pediu. ― Não te fiz nada. Diga para aquele desequilibrado do Lucas esquecer isso. É passado. E, se ele ainda insistir em querer resolver isso na base da violência, que ele venha me bater pessoalmente e que ele deixe de ser um covarde para ficar mandando as suas putinhas no seu lugar.
― Você é um ridículo! ― Eu o humilhei. ― Isso que você é! Não foi Lucas quem me mandou! Ninguém me mandou! Ninguém manda em mim! E eu não sou putinha de ninguém!
O garoto começou a rir de mim.
― Cai fora daqui, otário, não vou te bater, você é só um bebezão mimado e veadinho. E diga para o Lucas que depois a gente acerta as contas.
Não respondi. Nessa hora, apenas virei as costas e fui embora. Assim que saí do seu campo de visão, aproveitei para correr. E corri muito. Droga… a noite estava ficando cada vez pior…
Eu, sinceramente, não sabia que porra tinha acabado de acontecer. Eu tinha perdido a cabeça. Toda a história do Lucas com o Maurício ficava girando na minha cabeça e estava me deixando bastante desconfortável. E Caio não era inocente. E nós dois sabíamos disso. E, o fato dele hipocritamente tentar se fazer de bonzinho, me irritou. Onde já se viu? Fumar e ter a cara de pau de dizer que eu devia me valorizar? Quem ele era para dizer isso? E desde quando ele se importava? Desde quando ele se importava comigo ou com um desconhecido? Isso me tirou do sério. E, o pior de tudo é que ele achou que o Lucas tinha me enviado para confrontá-lo. Isso era ridículo. Lucas nunca faria isso!
Ainda com raiva e um tanto quanto confuso, tentei ir atrás de descobrir algo sobre o Maurício. Precisava conversar com Thiago. Ele sempre sabia das coisas. Daí, mais que depressa, cheguei no salão e procurei por ele. Encontrei-o numa mesa com o pessoal do sétimo ano. Me sentei com eles.
― Olá, pessoal. ― Eu os cumprimentei.
― Ah… oi, Arthur… ― algumas pessoas me cumprimentaram.
Conversei um pouquinho com eles sobre alguns assuntos aleatórios e depois me dirigi para o Thiago.
― E aí, Thiago. ― Eu disse enquanto chegava mais perto dele.
― Oi, Arthur… e aí, novidades?
― Ei… se liga, preciso de uma informação…
― Uma informação? ― Ele perguntou desconfiado.
― Sim… acho que você pode me ajudar…
― Hum… se estiver ao meu alcance… ― ele respondeu.
― O que você sabe sobre o Maurício?
― O Maumau? Da nossa sala? ― Ele perguntou.
― Sim.
― Hum… nada demais… eu acho… ele é primo da Daniela, do oitavo…
― E você sabe alguma coisa sobre… se ele está gostando de alguém…? ― Perguntei.
Thiago me olhou estranho e disse:
― ―
668
― Por que demônios você quer saber isso?
― Ah, qual é! ― Eu tentei me esquivar. ― Não sou eu que quero saber disso… é pra uma amiga minha… ― menti. ― Se é que você me entende…
― Hum… entendi…
― Então? ― Perguntei.
― Olha… eu não sei se devo…
― Ah, qual é, Thiago! Você tá me devendo um favor, se lembra? ― Eu tentei persuadi-lo.
Ele olhou para os lados, para ver se ninguém estava ouvindo. Daí ele se virou para mim e disse:
― Olha… só não comenta isso com mais ninguém, mas… ouvi alguns comentários por aí de que o Maurício joga no outro time…
― O que!? ― Perguntei surpreso.
― Ele gosta de garotos! ― Ele explicou.
― Eu entendi de primeira! ― Eu disse.
― Ah… mas, então… não sei se é verdade, mas ouvi dizer que ele está caidinho pelo Lucas… do sexto… seu amigo…
Quando Thiago disse isso, minha pressão caiu. Não era possível… não… isso não podia estar acontecendo… Lucas realmente estava traindo o Rafa com o Maurício… tudo agora estava se encaixando… e eu estava completamente confuso sobre o que fazer. Foi quando senti uma mão tocar meu ombro. Levei um susto quando ouvi aquela voz fina e melódica.
― Ei! Arthur! Pode vir aqui um pouquinho? ― Era Lucas.
Olhei para Thiago, que disfarçou e olhou para baixo. Olhei para o Lucas e, sem saber o que fazer, respondi:
― Aham…
Nós dois saímos dali e fomos para a entrada do salão, onde havia menos barulho.
― O que foi? ― Perguntei.
Eu não sabia mais o que pensar sobre ele. Eu não sabia mais como me comportar perto dele.
― Eu estou indo falar com a Giovanna agora. Você ainda quer que…?
Puta que pariu… eu não sabia o que fazer… eu não sabia o que responder… eu não sabia mais o que eu queria… eu precisava contar tudo isso que estava acontecendo para alguém… daí só respondi:
― Ai, porra…
― O que foi? ― Ele perguntou.
― Ah… nada não… ― eu tentei disfarçar. ― É que eu não achei que esse momento fosse chegar tão rápido…
Inventei uma desculpa. Mas o que estava me abalando mesmo era tudo isso que estava acontecendo ao mesmo tempo.
― Do que você está falando?
― Droga, Lu! Estou nervoso… ― eu disse completamente desorientado.
― Ah, qual é, Arthur… achei que a gente já tinha passado dessa fase!
O pior é que ele achava que eu estava nervoso por causa da garota…
― Eu sei… eu sei…
― Olha, se você fizer igual fez comigo, está ótimo… tenho certeza de que ela vai gostar! ― Ele tentou me acalmar.
― ―
669
Quando lembrei do nosso beijo, fiquei mais confuso ainda. Daí me imaginei beijando a Giovanna daqui a alguns minutos… não sei se seria a mesma coisa… eu queria, mas… eu sinceramente não sei se seria a mesma coisa…
― Mas essa é a parte fácil… ― eu disse. ― Sobre o que vamos conversar? Antes e depois?
― Sei lá… tenta só se abrir pra ela… você viu que não é o fim do mundo…
― Mas, quando a gente se beijou, foi diferente… ― eu tentei explicar. ― já éramos amigos! Eu mal tenho intimidade com ela! Ela nem sabe o meu nome! O que eu vou falar?
― Olha… só seja você mesmo! ― Ele tentou me ajudar.
― Ser eu mesmo? Qual é, Olhos Verdes! Nós dois sabemos que esse é uma péssima ideia!
― Tá! Okay! Okay! Agora eu entendi seu desespero!
― E o que eu devo fazer? ― Perguntei.
― Não sei… vai pensando em coisas legais pra falar com ela!
― Tipo o que?
― Não sei! Só tenta NÃO falar sobre nerdices! Ou sobre Minecraft! Isso entendia qualquer garota!
― Mas eu vou falar sobre o que, então?
― Olha, eu preciso ir… marcamos de nos encontrar daqui dez minutos…
― ESPERA! ― Eu gritei e o segurei pelo braço. ― Você pode ver se meu hálito está bom? ― Pedi.
Ele olhou para os lados e se aproximou de mim. Daí eu soltei meu hálito na cara dele e ele disse:
― Tá ótimo. ― Mas, sinceramente, não sei se ele foi honesto.
Daí ele se virou para ir embora, mas eu o segurei de novo.
― ESPERA! ― Gritei.
― O que foi? ― Ele perguntou.
― Como estou? ― Perguntei.
― Espera! ― Ele exclamou e desabotoou um botão da minha camisa. ― Prontinho!
Quando se ele virou para ir embora novamente, eu o segurei.
― ESPERA! ― Gritei.
― O que foi?
― Não me deixa aqui sozinho! ― Pedi.
― Ah, pelo amor de deus, Arthur! Vira homem! Vai dar tudo certo!
Daí ele me deu dois tapinhas no ombro e disse:
― Quando a hora chegar, eu venho te chamar.
E ele me deixou sozinho. Droga! E agora? Lucas tinha ido conversar com a Giovanna e ia tentar convencê-la a ficar comigo.
Resolvi dar uma volta pela festa, para ver se flagrava alguma fofoca. Primeiramente, fui até o bar, para pegar alguma coisa para beber. Peguei uma batida de morango com guaraná e observei atentamente o salão. Foi quando bati os olhos no Maurício. Fiquei encarando ele, que agora conversava com alguns meninos da nossa sala. Alguns segundos depois, ele se retirou da roda e foi embora. Olhei para os lados e resolvi segui-lo. Cruzei o salão da festa e fui o acompanhando até o banheiro. Ele entrou lá e eu o segui.
Não tinha ninguém no banheiro além de mim e do Maurício. Na parede, tinha três mictórios, ele se dirigiu até o que ficava no meio. Eu, mais que depressa, fui no que ficava ao lado do dele.
― Oi, Arthur! ― Ele me cumprimentou quando me viu.
― ―
670
― Oi… Maurício… ― eu disse enquanto abaixava meu zíper.
― Legal a festa, né? ― Ele disse quando o barulhinho de seu xixi ecoou pelo banheiro.
― É sim… ― eu concordei enquanto botava o pau pra fora.
Ficamos em silêncio por dois segundos.
― E aí… ― eu disse. ― Já ficou com quem? ― Joguei verde.
― Ah… ― ele disse rindo. ― Que isso… eu? Não fiquei com ninguém não… ainda…
― Hum… tem certeza? ― Perguntei. ― Um menino bonito como você, deve conseguir ficar com quem quiser…
Nessa hora, o garoto começou a rir e eu pude perceber que suas bochechas ficaram vermelhas.
― Ah… obrigado… ― ele disse olhando pra cima.
― Só dizendo… ― eu disse enquanto fazia xixi.
― Você também é muito bonito, Arthur… ― ele devolveu o elogio.
― É… obrigado. ― Eu agradeci.
Nossa… isso tinha sido meio gay… ainda bem que ninguém estava ouvindo…
― Que bom que só tem a gente aqui, né? ― Eu disse rindo disso.
Nessa hora, o garoto ficou mais vermelho que nunca.
― Ah… eu acho… que sim… o que você quer dizer com isso? ― Ele perguntou e olhou pra mim.
― Ah… você sabe… seria estranho se alguém ouvisse essa nossa conversa, não acha?
― É… ― ele disse voltando a olhar para cima. ― Foi exatamente isso que pensei…
― Pois é… ― eu disse enquanto guardava meu pênis de volta na cueca.
― É… ― ele disse meio sem jeito e foi lavar as mãos.
Eu o acompanhei e fui lavar as mãos também.
― E você… ― Maurício disse.
― O que tem eu? ― Perguntei.
― Já ficou com alguém hoje?
― Ah… não… ― respondi. ― Mas estou quase lá… ― eu disse me referindo a Giovanna e sorri.
Nessa hora, o garoto voltou a ficar vermelho e coçou a cabeça. Ele pareceu estar confuso. Será que eu tinha dito algo de errado?
― Ah… tá… claro… ― ele disse de volta. ― E… você vai ficar aqui até tarde…?
― Eu pretendo… ― respondi sendo sincero.
― Então… tudo bem… eu acho… ― ele disse. ― A gente… se encontra por aí… então… mais tarde… ― ele disse timidamente.
― Tá… a gente se encontra…
Então ele sorriu mais uma vez e foi embora:
― Tchau… Arthur…
― Tchau… ― eu me despedi.
Ele foi embora e eu continuei ali no banheiro. Me olhei no espelho, penteei meu cabelo mais uma vez, lavei a boca, chequei meu hálito, arrumei meu paletó e depois entrei num dos boxes para pensar. Abaixei a tampa do vaso e me sentei ali em cima.
Maurício tinha jeito de gostar de meninos… quando eu o chamei de bonito, jogando verde, ele respondeu com um outro elogio. Não sei se um hétero faria isso… provavelmente eles apenas agradeceriam com um obrigado… e não me chamariam de bonito de volta… estranho isso… foi quando ouvi alguém entrando no banheiro.
― Arthur?
Merda! Como o Lucas tinha me achado aqui tão rápido?
― ―
671
― AH! NÃO! ― Gritei. ― JÁ!?
Destranquei o boxe e saí de dentro. Mas Lucas não estava animado. Ele estava com um semblante triste estampado no rosto. Não precisava ser um gênio para perceber que Giovanna tinha me recusado e que Lucas tinha vindo para dar a notícia.
― O que foi? ― Perguntei mesmo sabendo a resposta.
Ele fez um sinal de não com a cabeça, confirmando minha teoria.
― Tá falando sério? ― Perguntei pra confirmar.
― Desculpa… ― ele disse triste.
― Ah… porra! ― Suspirei aliviado. ― Puta que pariu! Ah… não acredito! Ah… caralho! ― E então eu comecei a rir.
― O que foi? ― Lucas perguntou assustado.
― Nossa… eu nunca me senti tão aliviado na vida! Eu estava quase tendo um ataque do coração… sente aqui!
Eu me aproximei dele e peguei na sua mão, para botá-la em cima do meu coração. Ele me olhou e nós nos encaramos por um segundo. Daí ele piscou algumas vezes e retirou rapidamente a mão de mim.
― O que aconteceu? ― Perguntei me referindo a Giovanna.
― Podemos ir conversar lá fora? ― Ele sugeriu.
― Tá… ― concordei.
Lucas me guiou para fora da festa. Imaginem minha surpresa quando ele me levou para o mesmo lugar que ele tinha levado Maurício. Passamos por aquele caminho escuro e seguimos para o campo de futebol, que ficava num lugar bem afastado do salão.
Lucas estava fazendo muito suspense. E se… e se, na verdade, ele nem tinha falado com a Giovanna? E se ele estivesse me trazendo aqui para dizer que não queria que eu ficasse com a Giovanna porque ele gostava de mim e me queria para ele? E se ele estivesse me trazendo aqui para fazer comigo o que tinha feito com Maurício mais cedo? E se estivesse me trazendo aqui para ficar comigo? Será que eu devia? Será que eu teria coragem de fazer isso com o Lucas? Será que eu teria coragem de fazer isso com o Rafa? Será que era isso mesmo que estava acontecendo? E se Lucas quisesse abrir seu coração para mim? Será que eu devia abrir o meu para ele? Eu pensei muitas coisas no caminho.
Escalamos vários blocos de concretos que formavam a arquibancada até chegarmos ao topo. Ele se sentou ao meu lado e disse:
― Então… eu fui conversar com ela, Arthur…
― E aí? ― Perguntei.
― E aí que… droga… ― ele disse.
― O que foi? ― Perguntei já tendo uma ideia.
― Não sei como dizer isso sem te machucar…
Nessa hora, comecei a ficar preocupado…
― É que… eu gosto muito de você e…
― Desembucha, Olhos Verdes… ― tentei pressioná-lo.
― É que… ela… ela tá gostando de outra pessoa…
Quando ele disse isso, olhei para céu. Ah… era de se esperar… claro que ela estaria gostando de outra pessoa… todo mundo gostava de alguém… por que ela não? Mas, mesmo assim, ainda me magoou um pouco…
― Au… doeu… ― eu disse.
― Sinto muito… ― ele disse olhando para baixo.
― Quem é o cara? ― Perguntei.
― Então… ― só faltava ele querer me enrolar.
― ―
672
― Então o que? Eu conheço? É da minha sala?
― Arthur, o que eu te disser aqui, você não pode contar pra ninguém…
Nessa hora, senti meu coração se acelerar… será que seria agora que ele se declararia para mim? Eu estava começando a ficar nervoso, pois não sabia se teria coragem de fazer o mesmo.
― O que? Do que você está falando? ― Perguntei.
― A Gi… ela gosta da…. Bruna…
Eita… peraí… por essa eu não esperava…
― O QUE? ― Gritei sem querer. ― ELA É GAY?
― Olha… ― ele disse. ― Eu… eu sinto muito…
― Isso explica muita coisa… ― eu disse.
― Como você está se sentindo? ― Ele perguntou.
Sinceramente? Eu achei que fosse ser pior… mas acho que só não foi pior porque minha cabeça estava em outra pessoa agora…
― Ah… acho que normal… ― eu disse.
― Normal? Não tem como se sentir normal!
― É só que… não sei… acho que isso me conforta um pouco… ― admiti.
― Como assim?
― É que… quando eu levei meu primeiro fora dela, eu acabei… eu acabei enchendo minha cabeça de coisas… sabe? Eu achei que eu fosse o problema… mas… agora… agora eu sei que o problema não sou eu… isso me conforta bastante…
― Ah… que bom, Arthur… mas eu sempre tentei te dizer isso… ― ele disse.
Talvez fosse verdade.
― É… acho que agora eu entendo…
Respirei fundo e me reclinei para trás me apoiando com as minhas mãos. Daí nós continuamos encarando o céu. Foi quando uma estrela cadente passou.
― Olha! Você viu!? ― Ele gritou animado. ― Uma estrela cadente!
― Vi sim… ― eu disse.
― Acho que esse lugar é mágico! É a segunda que eu vejo hoje! ― Ele disse graciosamente. Achei fofa a maneira como ele se animou com tão pouco.
― É a segunda de muitas… não é o lugar que é mágico, Olhos Verdes… é a data…
Vimos outra estrela cruzar o céu.
― OLHA! OUTRA! VOCÊ VIU? ― Ele gritou e encostou a mão em mim.
― Vi… é isso que chamam de chuva de meteoros. Eu até tinha me esquecido de que aconteceria hoje… é uma Geminidas…
Eu, por mais cético que fosse, achei que seria legal fazer um pedido para uma estrela cadente… não custava nada e vai que… daí pedi… bem… como posso dizer isso? Pedi por mais um beijo com o Lucas…
Mas isso só me fez ter vontade de chorar, porque… não era certo… primeiro que eu já me achava errado o bastante só por gostar dele tanto assim… e, segundo, Lucas era um menino compromissado. Ele tinha o Rafa. E era feliz com ele. Mais feliz que qualquer pessoa. Eu sei que o que eles tinham feito comigo alguns dias atrás não significava nada, até porque eles só fizeram isso comigo porque tinham certeza de que eu era hétero. E eu também só fiz aquilo porque tinha certeza disso também… até aquele dia…
Lucas mexeu comigo de uma tal maneira que eu não conseguia explicar. Não existia razão quando eu estava com ele. E isso estava começando a crescer dentro de mim o suficiente para me frustrar. E olha o que eu estava fazendo agora! Estava pedindo para a porra de uma estrela uma porra de um beijo com a porra de um menino. Um menino! Onde eu estava com a
― ―
673
cabeça e por que era tão difícil aceitar e admitir isso? Eu estava completamente confuso e perdido. Daí comecei a chorar.
― Arthur… ― ele disse solidariamente. ― Chora não…
Mas isso só me fez chorar mais. Daí cedi e dei um abraço nele.
― Eu gostava tanto dela… ― eu disse.
Mas mal sabia Lucas que essa frase significava uma coisa completamente diferente. Passei os braços em volta de sua cintura e o abracei mais forte.
― POR QUE!?!? ― Gritei chorando em seu colo.
― Arthur… ― ele tentou me acalmar passando a mão em meus cabelos.
― POR QUE!? SÓ ME DIZ POR QUE!!! EU GOSTAVA TANTO DELA!!!
― Fica assim não…
Foi quando senti algumas gotas de água caindo na minha cabeça. Olhei para cima e vi que Lucas chorava também. Meu coração nunca doeu tanto. Quando vi aqueles olhos verdes e brilhantes repletos de lágrimas, me senti mal.
― Por que você tá chorando? ― Perguntei.
― Não sei… acho que é porque você está triste… ― ele disse e tentou sorrir.
Afundei minha cabeça em seu colo e chorei ainda mais. Nessa hora, pensei em abrir meu coração e contar tudo para o Lucas. Eu tinha que contar o que eu estava sentindo. Eu tinha que pedir ajuda para ele. Eu tinha que perguntar para ele sobre Maurício. Eu tinha que abrir as comportas e deixar que esse turbilhão de emoções saísse de dentro de mim. Eu tinha que fazer isso. Foi quando eu levantei a cabeça e avistei Rafael. Ele estava parado em pé nos olhando a alguns metros daqui. Lucas fez um gesto com a mão e o mandou embora. E agora eu estava mais confuso ainda. Seria tão injusto jogar tudo isso nas costas do Lucas. Eu sei que ele sofreria por mim. E eu não queria isso. Seria injusto com ele, seria injusto com o Rafa, seria injusto com todo mundo. Talvez o melhor mesmo fosse reprimir e deixar pra lá… mas isso era tão difícil… reprimir só era injusto para mim!
Eu e o Lucas ficamos por ali por pelo menos mais meia hora. Ele ficou acariciando meus cabelos enquanto eu ficava chorando sem parar. Depois de todo esse tempo, ele disse:
― Tá mais calmo?
Eu fiz que sim com a cabeça.
― Fica triste não… se você fica assim, eu também fico…
Eu fiz que sim com a cabeça novamente.
― Eu sinto muito pela Gi…
― Valeu… ― eu agradeci.
― Eu gostaria de poder fazer alguma coisa…
― Você já fez… até mais do que devia… ― o consolei.
― É… acho que sim… ― ele concordou.
― Obrigado… ― agradeci. ― Por ter tanta paciência comigo…
Ele não disse nada, mas assentiu com a cabeça. Daí eu criei coragem e me levantei.
― Vamos entrar? ― Ele sugeriu. ― Senão vamos acabar pegando um resfriado… está muito frio.
― Tá… pode ser… ― eu concordei enquanto limpava o nariz.
Voltamos para o salão e o Lucas disse:
― Arthur… eu preciso muito, muito conversar com o Rafa… você vai ficar bem?
Eu fiz que sim com a cabeça.
― Tá… então… nos vemos daqui a pouco, pode ser? ― Ele perguntou.
― Ah… na verdade… ― eu disse. ― Acho que eu já vou embora… a noite já está arruinada mesmo…
― ―
674
― Sério? ― Ele disse se sentindo triste.
― Sim… vou ligar pra minha mãe… ― expliquei.
― Tá… você quem sabe…
― Então… valeu, Lucas… por hoje…
― Sempre que precisar, Arthur…
― Então… acho que é isso… tchau… ― eu disse e estendi a mão.
― Tchau… ― ele disse e me cumprimentou.
Daí ele se virou para ir embora.
― Lucas! ― Eu o chamei.
Ele olhou para mim e eu lhe dei um abraço. Eu precisava tanto desse abraço que eu nem pensei se teria alguma consequência. Mas acho que todos iriam interpretar como um abraço de amizade, que é o que era, de qualquer maneira. Ele me abraçou de volta e ficamos assim por mais alguns segundos, até que finalmente nos separamos e ele disse:
― Até, então, Arthur… se cuida…
― Você também…
E eu me virei para ir embora. E eu ia embora. Eu ia mesmo. Ia para a entrada do salão ligar para minha mãe… se não tivesse visto algo que me chamou a atenção.
Na mesa dos garotos do nono ano, havia algumas garrafas de vodka. Talvez seria uma boa maneira de afogar minhas mágoas.
Sem pensar duas vezes, me dirigi até a mesa dos garotos mais velhos. Adivinhem quem eu encontrei lá… sim… exatamente… Caio…
Quando ele me viu, ele fez uma cara de “puta que pariu, esse garoto de novo não” e suspirou de saco cheio.
― Aff… você de novo!? ― Ele exclamou quando me viu. ― O que é que você quer agora?
― Oi pra você também. ― Eu disse.
Nessa hora, todos os garotos da mesa voltaram os olhares para mim. Tentei não mostrar que eu estava intimidado. Caio se levantou da mesa e veio em minha direção.
― Escuta aqui, seu pirralho de merda! Eu já te disse que não vou te bater, entendeu? Mas… tá vendo aqueles garotos ali atrás? Eles são diferentes de mim. Eles estão sedentos por uma briga. E eles estão mais sedentos ainda por sangue de veadinhos como você. Se você ousar encostar um dedo em mim, eu te garanto que todo mundo ali vai acabar com a sua raça. E eu não vou fazer nada para impedir, seu verme desprezível. Depois não me diga que eu não te avisei.
― Acabou? ― Provoquei ele.
― Pode apostar que sim. Agora se mande daqui.
― Quero beber com vocês. ― Eu disse.
― Aff… lá vem você de novo…
― Qual é… tem álcool suficiente pra um rinoceronte ali.
― Me diz um motivo para dividir com você?
― Me diz um motivo para não dividir comigo! ― Tentei argumentar.
― Eu que paguei pela bebida?
― Então você quer dinheiro? ― Perguntei.
― Não! ― Ele se defendeu. ― Não quero seu dinheiro, seu lixo! Não vou te dar vodka!
Foi quando eu contornei ele e alcancei a mesa dos meninos.
― E aí, galera! ― Eu exclamei. ― Posso me juntar a vocês pra encher a cara?
Os meninos trocaram olhares entre si e depois disseram:
― Claro! Chega aí!
Olhei para trás e Caio me olhava furioso. Daí ele veio se sentar ao meu lado na mesa.
― ―
675
― Você é mesmo inofensivo, não é? ― Perguntei para Caio enquanto um outro garoto me entregava a garrafa de vodka e um copo.
Ele não me respondeu, apenas suspirou irritado e deu um gole em seu copo.
― Gente… ― eu disse. ― Só vou beber um pouquinho…
Daí eu coloquei só um pouquinho de vodka no copo e devolvi o copo para a mesa, ficando com a garrafa na mão.
― Pronto.
Daí eu comecei a beber direto da garrafa. Quando os meninos entenderam que eu estava fazendo uma piada, eles começaram a rir muito. Eles ficaram exaltados com o garotinho aleatório que apareceu para beber com eles e que agora estava bebendo direto do gargalo. Os garotos não paravam de rir enquanto eu dava longas goladas na bebida.
Daí eu botei a mão no ombro do Caio e disse:
― Tá vendo!? Não encostei um dedo em você… encostei minha mão toda e não aconteceu nada… pelo visto, você é um daqueles que só fala, né?
Ele empurrou minha mão de seu ombro e disse:
― Cala a boca, filho da puta…
E daí eu comecei a beber… e beber… e beber… até tudo começar a rodopiar… e rodopiar… e rodopiar… foi… estranhamente engraçado…